Um dos maiores ataques da III República ao Parlamento, foi disferido esta semana por Rui Rio “y sus muchachos”.
A “estória” (que machada em parte o cerne do sistema democrático português) resume-se a uma frase: o PSD, com apoio do PS (e Soares a dar voltas na tumba), querem terminar com os debates quinzenais (em Londres são semanais) do governo na Assembleia da República.
A falta de cultura, também política, o desapego democrático baseado no absolutismo do “omnis potestas a deo”, a ideia paternalista sobre o povo e a vontade de subjugação de uns perante outros é do pior encarniçamento salazarento de que nem Ventura sofre; mas sofrem Rio e os seus pares.
Não seria preciso ler Norberto Bobbio, Pasquino, Luís Sá ou José Fontes para saber que o sistema democrático, nomeadamente o português, tem no parlamento a base mais sólida da democracia de onde saem, num equilíbrio justo com o Presidente da República, os governos.
Ler a Magna Carta, os Bill of Rights ou Federalist Papers daria para que os deputados do PSD soubessem que “no taxation without representation” ou ainda mais antigo que “Quod omnes tangit ab omnibus approbari debet”.
Na verdade, o parlamento, para além do debate – estético e retórico, no melhor sentido dos termos, ademais originário da produção legislativa, tem um conjunto de outros instrumentos – dos quais a fiscalização ao governo é um deles – que se destacam, igualmente, as comissões, cuja importância se eleva quando assumem o cariz de inquérito (vejam-se casos como BPN, Camarate, etc). Destacar a importância do parlamento em pleno século XXI era “aula” que supunha desnecessária. E é, somente estamos a sinalizar protofascistas, antiparlamentaristas primários e gente que desqualifica deputados e o seu local de trabalho. E é sob esta palavra que me deu mais vontade de rir sobre os paupérrimos argumentos usados para justificar o injustificável. Vejamo-los com certo detalhe, também para divertimento:
“O primeiro-ministro não pode passar a vida em debates quinzenais. Tem é de trabalhar”
Várias ideias centrais que passam: ir ao parlamento é perda de tempo; no parlamento não se trabalha; o governo não tem que dar “cavaco” do que faz aos deputados; não faz parte do trabalho do governo dar explicações aos representantes do povo. Tudo somado é deplorável!
“O Governo tem de trabalhar e não legislar”
Desconhecerão os “novéis” defensores desta peregrina ideia que o Governo também legisla? E que isso, por si só, é um relevante trabalho?
“Rio quer na oposição o mesmo que pretenderia (se algum infortúnio pátrio o colocasse) no poder”.
Esta é mais degradante ainda e revela os intentos do ex-autarca. Isto é, não tem que dar explicação a ninguém sobre nada porque ao jeito de Luís XIV, o Estado passa a ser ele.
“O parlamento só tem importância quando lá vai o governo”.
Pode ser um facto se os deputados não trabalharem para além disso (nas comissões e nas diversas interpelações que podem e devem fazer ao governo e à administração pública sob tutela). Mas se fizerem bem o trabalho de debate, confronto, fiscalização e de novas propostas em sede dos debates quinzenais, não farão pouco e darão à luz casos que de contrário – por falta de momentos de debate – se secundarizam e se diluem, ou seja, o povo mais longe dos debates políticos e dos seus representantes.
O ressuscitar do velho epítome cavaquista do “deixem-nos trabalhar” – ele que só tinha a moderação presidencial já que o parlamento estava no bolso, diz bem da sede destes novos vampiros.
Sejamos claros, Portugal merecia mais do que esta falta de qualidade cultural, política e democrática dos deputados do PSD e, por conveniência, do PS. Rio com patrocínio socialista, assobiando para o ar, quer esventrar a democracia.
Bem Vistas as Coisas, Rio é mais perigoso que André Ventura.
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